Dicas de Memorização de Repertório

Olá, pessoal! Neste primeiro post de 2022 e primeiro post no site novo, trago dicas sobre um assunto que dá insegurança a muitos pianistas: a memorização do repertório. Eu mesma preciso praticar muito para memorizar uma peça e sempre dá aquele medo de esquecer na hora da performance. Mas é possível estimular boas práticas nos alunos para que eles tenham segurança ao tocar de cor. Você incentiva seus alunos a memorizarem as músicas? Seus alunos costumam tocar de cor nos recitais? Hoje trarei algumas dicas para trabalhar a memorização desde os estágios iniciais da aprendizagem do instrumento. 

Geralmente, alunos iniciantes decoram suas pequenas peças com facilidade. Elas são curtas, cheias de padrões e os alunos as repetem várias vezes durante a prática em casa. No entanto, esse tipo de memorização não é muito eficaz para peças mais longas e complexas e para criar memórias de longa duração. Ela pode causar insegurança na hora da performance e criar bloqueios quando um erro acontece. Por isso, é muito importante incentivar e trabalhar a prática e a repetição conscientes, que resultarão em um aprendizado mais sólido e em uma memória mais segura. 

Para um aprendizado e uma memorização segura, é preciso dar atenção às diversas habilidades que utilizamos ao aprender e lembrar uma música, como sensações táteis ou cinestésicas (memória muscular), percepção auditiva, memória visual, e habilidades cognitivas (memória analítica). Quando uma peça é apresentada ao aluno pela primeira vez, já devemos nos preocupar em estimular e desenvolver esses aspectos e ensinar ao aluno como praticá-los em casa. Todos esses aspectos devem trabalhar conjuntamente para uma memorização eficaz.

Memória Muscular, Motora ou Cinestésica:

Esse tipo de memorização é importante para a automatização da performance, para que o pianista deixe a parte técnica fluir e possa se concentrar nos elementos musicais e interpretativos. No entanto, ela por si só não gera uma memória confiável. Se um erro ocorrer, ou o aluno estiver tenso e o movimento for interrompido, pode ser difícil retomar, causando mais ansiedade. Para uma memorização motora eficaz, é necessário escolher bons dedilhados e deixá-los muito seguros. Além disso, não é recomendável trocá-los a poucas semanas da performance, pois deixará a memória muscular insegura. Também é importante fazer um trabalho técnico diligente desde o primeiro contato com a peça, e praticar em diversos andamentos. A parte rítmica deve ser praticada com atenção, sendo aconselhável o aluno bater o ritmo antes de fazer a primeira leitura ao instrumento.

Memória Auditiva

A memória auditiva pode ser trabalhada desde as primeiras aulas através do repertório por imitação, por exemplo. Um currículo que englobe percepção musical, improvisação e aprendizado de ouvido auxilia o aluno a perceber padrões melódicos e harmônicos que podem guiá-lo a saber o que virá pela frente na música. Além disso, quando ele foca no som durante a performance, ele consegue se concentrar em produzir uma sonoridade bonita e uma interpretação aprofundada. Escutar gravações da obra em estudo também ajuda na sua internalização.

Memória Visual

A memória visual engloba visualizar partes da partitura e também o teclado e o movimento das mãos. É arriscado confiar apenas nela, pois, se na hora da performance, você olhar para outro lugar que não está acostumado, pode se perder. Para treinar a memória visual, o professor pode, por exemplo, utilizar flahscards para trabalhar o reconhecimento de intervalos, acordes, padrões melódicos e rítmicos; incentivar o aluno a copiar esses elementos ou seções da peça  em uma pauta musical; pedir ao aluno que alterne a mão para a qual ele geralmente olha; incentivar o aluno a manter os olhos na partitura enquanto tocar; e pedir para o aluno tocar de olhos fechados enquanto visualiza suas mãos em sua mente.

Memória Analítica

Esse tipo de memorização começa antes mesmo de se tocar a peça. Ela envolve o reconhecimento de elementos estruturais da peça, como tonalidade, notas iniciais, fórmula de compasso, análise de sequências harmônicas, identificação de padrões rítmicos e melódicos, identificação da forma e de repetições, compreensão da relação entre as mãos, reconhecimento de diferentes vozes, etc. Deixar o aluno realizar anotações na partitura, criar esquemas ou mapas para a estrutura da peça e incentivá-lo a verbalizar o que ocorre em cada trecho são algumas maneiras de desenvolver esse tipo de memória. Além disso, o estudo lento, focado, e em pequenos trechos também é essencial.

Estratégias de Estudo para a Memorização Efetiva

Trago agora algumas estratégias de estudo que os professores podem trabalhar com os alunos para levá-los a uma prática focada e consciente que contribui para o aprendizado duradouro e a memorização efetiva. Não é uma lista completa, mas traz alguns dos pontos que considero mais importantes:

  1. Dividir a música em pequenas seções e praticar cada uma diligentemente, decorando uma a uma e conectando-as os poucos.
  2. Começar o estudo de pontos diferentes da peça.
  3. Praticar extremamente devagar estando totalmente focado. Em um primeiro momento, com o auxílio da partitura, e depois de cor.
  4. Memorizar mãos separadas, principalmente a mão esquerda (que tende a ser negligenciada).
  5. Não repetir um trecho sempre da mesma maneira: alterar dinâmicas, articulações, andamentos… em cada repetição para manter a mente focada.
  6. Revisar diariamente as partes memorizadas. Por exemplo, se você estudou os últimos 4 compassos da música em um dia, no dia seguinte pratique os 4 compassos anteriores e revise o que foi estudado no dia anterior. 
  7. Toque a música fora do piano, ou tente tocá-la apenas em sua mente.
  8. Marque e pratique pontos estratégicos da música, de onde você consiga pegar rapidamente se um erro ocorrer.
  9. Toque a música com a partitura guardada em um local distante, para resistir à tentação de “dar só uma olhadinha.” 
  10. Grave-se tocando para testar a memória sob pressão.

Estratégias para os Professores Testarem a Memória dos Alunos

Em aula, os professores podem testar se o aluno está pronto para se apresentar sem o auxílio da partitura. Algumas estratégias que podem ser utilizadas são:

  1. Pedir para o aluno descrever e executar elementos estruturais da peça, como por exemplo um padrão rítmico repetitivo, motivos, intervalos, tonalidades, cadências etc.
  2. Pedir para ele tocar trechos aleatórios de mãos separadas de cor. 
  3. Pedir para ele tocar lentamente sem partitura para testar a concentração.
  4. Pedir para ele tocar para outros alunos (por exemplo alunos que tem aula antes ou depois), parentes e amigos
  5. Imprimir outra cópia da música, cortar os compassos (ou pequenas seções) e sortear um. Pedir para o aluno começar a tocar daquele compasso em diante. 

Essas são algumas dicas para se trabalhar a memória com alunos de qualquer nível e gerar confiança na performance de memória, mas claro, não é uma lista completa. É importante que os alunos se acostumem a uma prática consciente para desenvolver as habilidades de memorização e sintam-se seguros ao se apresentarem em público sem o auxílio da partitura. Além disso, para que o processo de memorização seja o mais efetivo possível, é importante que o aluno aprenda de forma correta desde o primeiro contato com a peça. Isso evitará que ele decore erros e crie dúvidas e inseguranças na hora da performance.

Fontes que utilizei para escrever este post:

  • Questions and Answers by Frances Clark
  • The Independent Piano Teacher’s Studio Handbook, de Beth Gigante Klingenstein
  • Professional Piano Teaching, vol. 2, de Jeanine M. Jacobson

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